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sexta-feira, 5 de abril de 2013

Conheci o Sérgio Sampaio em um Hospício em Engenho de Dentro




por Thiago Ortman


Antes de começar qualquer história: não, eu não estou louco, fui parar no hospício e por isso vi o, já falecido, Sérgio Sampaio por lá. Mas a minha história realmente começa no hospício de Engenho de Dentro. Estive lá na semana passada para acompanhar a atividade cultural dos amigos do Norte Comum, que agora tem uma ala disponível no Hotel da Loucura, espaço dentro do próprio hospício (Nise da Silveira).


Bem vindos ao hotel da loucura.



O evento foi belíssimo, com uma série de apresentações, shows (entre eles da banda de rock instrumental recifense Joseph Tourton), declamações de poesias, e tudo mais, com a presença dos artistas do hospício (poetas, atores...) tendo oportunidade de apresentar seus trabalhos para uma galera que nunca tinha pisado lá – não era o meu caso, mas ainda não conhecia bem o trabalho deles, além das belas poesias, frases e pinturas no Hotel da Loucura.





Já estava escuro nos jardins do Nise quando um rapaz chamado Arthus surgiu com seu violão, disse que havia treinado o repertório de (um tal de) Sérgio Sampaio, mas nada estava muito ensaiado e muita “coisa” iria surgir na hora. 

Começou seu show de quase uma hora, só com versões do músico até então desconhecido para mim. Então, ali mesmo, descobri que era o compositor de “Eu quero botar meu bloco na rua” - essa eu conheço! - que toca em todas as festas de música brasileira da Lapa. As canções falavam de amor, loucura, poesia, e que lugar de samba enredo é no asfalto. E todos ao meu redor cantavam, eu nada.







A ignorância era realmente minha. Na mesma noite cheguei em casa e comecei a pesquisa... o mais maldito dos artistas da MPB (como logo descobri) merecia mais do que uma mera pesquisa de google/wikipedia. 

Baixei o álbum “Tem que acontecer”, um dos seus dois discos produzidos nos anos 70. De cara, um sambinha, “Até outro dia”... Em pleno 76, um samba como aquele: com aspirações em Nelson Cavaquinho. Sua singela beleza já me conquistou, e olha que é complicado alguém me conquistar na primeira faixa. Em seguida, a música que deu sentido a tudo, “Que loucura”, a cantiga falava que as loucuras de amor levaram o cantor ao hospício em Engenho de Dentro, uma pérola! O álbum ainda tinha blues acústico (“Cabras Pastando”); a brasilidade de Os Novos Baianos (“O que pintá, pintou”) ou o sambinha a lá Tom Zé (“Velho Bandido”) presentes... mas ao mesmo tempo não soando menos caricatural que os próprios. Ainda vale citar a dobradinha “O teto da minha casa” e “Ninguém vive por mim”, e suas assimilações com a viola caipira e a vibração de Marcos Valle naqueles mesmos tempos, respectivamente. É uma obra-prima de um dos anos mais ricos da música brasileira*.







Fui para o próximo álbum: “Eu quero é botar meu bloco na rua” (1973). A inspiração não era a mesma, com um teor de pretensão setentista em sua produção, indo por um caminho semelhante a uma série de outros álbuns da época. Ainda sim, tinha músicas que em pouco tempo de Sergio Sampaio já considero entre suas melhores: “Filme de Terror”, “Não tenha medo, não!”, “Dona Maria de Lourdes”, e a já conhecida faixa-título.







Eu posso ser o último. Mas conhecer Sergio Sampaio no hospício que o “acolheu após enlouquecer de amor” gerou em mim uma crônica gratificante. E se eu não sou o último, corram atrás! Se nada disso serve de consolo, o cara da direita era amigo, ídolo e ainda formou uma banda-de-um-LP com ele (o qual ainda não ouvi)...






...Enquanto isso, “os automóveis estão invadindo a simples cidade”.







*76 foi ano de Chico Buarque e seu “Meus Caros Amigos”, enquanto Tom Zé estava “Estudando o Samba”; as “Maravilhas Contemporâneas” de Luiz Melodia nasciam; “Imyra, Tayra; Ipy”, Taiguara; Cartola e seu homônimo; “Domingo Menino Dominguinhos” do próprio; As “Brigas de Galos” de João Bosco; os “Geraes” de Bituca; e a “Alucinação” de Belchior... ufa. Tudo foi em 76.

Um comentário:

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